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Curso de crioulo haitiano une discentes em uma Rasambleman contemporânea

Iniciativa, em que além da língua é possível conhecer mais da cultura do Haiti, tem como meta o multilinguismo e a interculturalidade
publicado: 21/02/2025 13h38, última modificação: 21/02/2025 13h39

Bonswa tout moun!”. É assim que Mackenson Beauvais e Audain P Evald Lobatchevsky iniciam suas aulas todas as sextas-feiras, na UNILA. Discentes da instituição, eles dizem “boa tarde, gente!” ao começarem uma atividade em que deixam os bancos escolares para se posicionarem em frente ao quadro, invertendo os papéis e sendo professores. Neste dia, Mackenson e Audain ensinam crioulo haitiano, um dos idiomas falados em seu país de origem, em um curso em que toda a comunidade unileira pode aprender não apenas a língua, mas um pouco mais sobre a cultura do país caribenho. A iniciativa integra o projeto de extensão “RasamblemanAnn pale kreyòl: o Haiti em sua língua, literatura e cultura”, que visa a promover a interação social e cultural dos haitianos em Foz do Iguaçu e estimular a integração no contexto pluricultural e plurilinguístico característico da UNILA.

Oferecido por membros do coletivo de estudantes haitianos Rasanbleman, o curso “Ann pale kreyòl” (“Vamos falar crioulo!”) e as demais atividades trazem em seu bojo um senso de coletividade. Como explica Mackenson Beauvais, “Rasanbleman é uma palavra em crioulo que significa juntar. Juntar todo mundo”. Segundo ele, o termo remete à Revolução Haitiana, e se refere aos encontros políticos e religiosos que promoviam um trabalho de sensibilização dos antigos escravizados, que se organizavam para as ações contra os colonizadores. Segunda república mais antiga do Hemisfério Ocidental, atrás apenas dos Estados Unidos, o Haiti foi o primeiro país latino-americano a declarar independência, em 1804, após este levante, que durou mais de uma década. Atualmente, além de evocar resistência, Rasanbleman evoca também sentidos de luta de todos em prol do bem comum. Algo almejado pelo coletivo: “A equipe construiu o curso em conjunto”, resume Beauvais, que está prestes a concluir sua graduação em História. 

 Multilinguismo e interculturalidade

 Discente de Letras, Audain P Evald Lobatchevsky é um dos que dividem a missão de ensinar seu idioma aos demais. Falante de “um pouco de chinês”, espanhol, português, inglês, italiano e de francês – língua também falada no Haiti –, ele conta que, na UNILA, aprendeu algumas palavras em tikuna e em guarani. Para ele, ao ensinar crioulo aos colegas da Universidade, ele colabora não apenas para a integração dos haitianos, mas também para o estabelecimento de um multilinguismo. “Diversidade linguística tem que ser com todos os idiomas. Não com alguns e outros sendo excluídos”, opina. “Essa é a importância de ensinar nosso idioma na Universidade”, complementa. Opinião corroborada por Beauvais: “A gente pensa que não só português e espanhol devem ser falados no espaço. Todas as demais línguas valem. Todas têm seu sentido no espaço”.

Este aspecto intercultural e multilíngue leva Beauvais a considerar a própria UNILA uma Rasambleman em que, assim como no Haiti, a “coletividade é forte” e onde “sempre se luta contra o individualismo”: “A gente tem que fazer uma Rasanbleman: reunir, juntar todo mundo para fazer as coisas boas, as coisas para o bem-estar da comunidade”, completa.

 Mediação cultural

 Essa mesma coletividade é almejada por Vitória Maria de Campos Vieira, que também vê na língua uma forma de aproximar culturas diferentes. Recentemente graduada em Mediação Cultural – Artes e Letras, ela conta que começou a aprender crioulo assim que ingressou na UNILA, em 2019, por acreditar que a “língua é uma ferramenta importante para poder ter aproximações às diversas culturas presentes” na instituição. Essa crença fez com que ela começasse seus estudos em kreyòl por conta própria, durante a pandemia. Posteriormente, ao regressar à universidade, manteve contato com os muitos estudantes haitianos, que a ajudaram a desenvolver o idioma. Atualmente, ela participa como uma das integrantes do curso e do coletivo.

“Eu nunca pude imaginar estar em um contexto que me permitisse interagir com pessoas com tantas línguas”, observa. Segundo ela, trata-se de algo que precisa ser visibilizado, para propiciar “uma real integração” entre os muitos atores que compõem a Universidade. “Como mediadora cultural, através do ‘Ann pale kreyòl’, eu procuro fazer esta integração de que tanto falamos, necessitamos e demandamos dentro desse espaço”, avalia. Para ela, à proporção que a UNILA cresce, é necessário institucionalizar as diversas línguas que a compõem, para ter um alcance maior e uma maior visibilidade.

Haitianos na UNILA

Uma das nacionalidades com maior número de discentes na UNILA, os haitianos somam atualmente 190 discentes ativos na instituição. Outros 75 já se graduaram. Inicialmente, os estudantes do país caribenho ingressavam na Universidade por meio do Pró-Haiti, processo implantado nas universidades públicas que visava a inserção dos imigrantes à sociedade brasileira. Mantida nos anos de 2015, 2016 e 2018, a iniciativa possibilitou a inscrição de 392 estudantes na UNILA. Em 2019, o programa foi descontinuado na instituição devido à mudança na regulamentação do Processo Seletivo Internacional (PSI). Com isso, o PSI passou a incluir também o Processo Seletivo para Refugiados e Portadores de Visto Humanitário (PSRH), seleção que abrange postulantes dessa nacionalidade.  Desde então, 7.399 haitianos tentaram uma vaga na UNILA. Destes, 3.582 apenas na seleção para cursar a partir de 2025. Os dados são da Pró-Reitoria de Relações Institucionais e Internacionais (PROINT). “É uma quantidade excepcional, e aprender a língua pode derrubar barreiras culturais de comunicação”, encerra Vitória

O curso

 Para participar do curso “Ann pale kreyòl” não é necessário inscrição prévia. Basta começar a frequentar as aulas, que ocorrem sempre às sextas-feiras, das 16h às 18h, na sala C308 (unidade Jardim Universitário), conforme calendário acadêmico.