Vida Universitária
Estudante, estudiante, etidyan, temimbo'e
Estudar: verbo que representa uma ação transformadora, praticamente revolucionária. E você, estudante, é o sujeito dessa ação, a essência desse movimento que representa um ciclo de aprendizagens e também de conquistas a partir do conhecimento adquirido. E sendo hoje, 11 de agosto, o seu dia, então um viva a todas e a todos os estudantes.
Na UNILA, pequenas revoluções acontecem a partir do cotidiano das pessoas que passam ou que passaram pelos ensinamentos em salas de aula, em ações de extensão desenvolvidas com a comunidade local e em pesquisas nas quais estudantes buscam conhecimento, em várias áreas, para a transformação de vidas.
A ciência é a responsável por transformar mentes inquietas e energias coletivas para o bem comum. O exemplo disso é o engajamento social que estudantes demonstram em ações diárias. Neste 11 de agosto, a UNILA quer homenagear seus estudantes fazendo um pequeno recorte sobre experiências de vida e de engajamento social. Os alunos unileiros são provenientes de diversas partes do mundo e, ao aqui chegarem, aprendem, mas também ensinam.
São muitas histórias para contar, mas aqui vamos conhecer um pouco mais da vida acadêmica da Maria Clara (estudante de Medicina que atua na extensão com mães e com crianças recém-nascidas), da Valentina (ativista cultural e política, natural de Foz do Iguaçu), do Carl e da Laura (do Haiti e da Colômbia, respectivamente; estudantes de pós-graduação que mantêm uma ONG de ajuda humanitária na cidade), da Fátima (ativista ambiental que veio do Amazonas) e de Biel Tupã (indígena de São Miguel do Iguaçu e defensor da língua e da cultura Guarani).
Extensão e cuidado com os recém-nascidos
Ah, a extensão universitária! Como ela faz diferença na vida do estudante! Maria Clara Serapião Ferreira sabe muito bem disso. Natural de Nova Iguaçu, no Rio de Janeiro, ingressou na UNILA em 2018, no curso de Medicina, e logo foi se encantando com a possibilidade de trabalhar mais próximo à comunidade. “Estou no 6º período e levo essa ideia desde que ingressei, quando a gente passou a ir para as Unidades Básicas de Saúde (UBS) e a ter um contato mais forte com o sistema de atenção primária aqui no município”, conta ela.
"É possível um contato
direto com a comunidade, que envolve troca de conhecimentos e experiências e que permite uma formação humanizada.”
Ela diz que sentiu a necessidade de pensar em um projeto voltado para a puericultura, ou seja, trabalhar com questões que se referem à mãe e à gestante. Então veio a ideia de propor um projeto de extensão sobre o tema. “Nosso projeto é voltado para a gestante que está quase ganhando o bebê e para crianças de até cinco anos. É um período de muitas dúvidas e angústias das mães, em que é necessário construir um conhecimento bem solidificado e de confiança para lidar com os bebês”, diz ela.
O projeto é dividido em quatro eixos, como explica Maria Clara: o primeiro é o de amamentação e introdução alimentar. “É difícil para o entendimento das mães, e a gente ensina para que não desistam da amamentação”. O segundo é sobre os cuidados iniciais com os recém-nascidos, incluindo informações sobre o sono do bebê, a posição correta para dormir e como dar banho. O terceiro eixo trata sobre a prevenção de acidentes domésticos. E o último é o de imunização infantil, o envolvimento dos pais com o tema da vacinação, a importância e o calendário correto para cada dose.
Com a pandemia, houve dificuldade para a realização de ações presenciais. Por isso, as integrantes do projeto Puericultura criaram um perfil no Instagram, onde passaram a esclarecer as principais dúvidas que as mães costumam ter. “Ali buscamos contribuir para a melhoria da comunidade, repassando conhecimento científico de qualidade, com embasamento e segurança para toda a população”. Ela acredita que é possível um contato direto com a comunidade, que envolve troca de conhecimentos e experiências e que permite uma formação humanizada.
Ativismo social e cultural em Foz do Iguaçu
Tem estudante de Foz do Iguaçu envolvido em atividades sociais? Tem e não são poucos. Um exemplo disso vem da força da juventude que se envolve nas áreas da cultura e da política na cidade. Valentina Rocha Virgínio está no último ano do curso de Geografia – Bacharelado. Ela é professora da rede pública municipal de ensino há seis anos e, antes de ingressar na UNILA, estudou magistério no Barão do Rio Branco, colégio tradicional da cidade, onde começou a ter uma função de liderança. “A gente conseguiu ver a escola como um lugar diferente, onde não era apenas para estudar. Passávamos mais tempo lá, período que ajudou na minha formação, na questão da representatividade mesmo”, lembra.
“[Carrego] a verdade no peito e o brilho nos olhos de quem só ensina porque aprendeu!”
Como é estudante que também ensina, ela se apresenta da seguinte forma: “sou atriz, de uma família de artistas e tudo isso que eu faço é uma questão de herança, de um grupo que já vem atuando na cidade há 40 anos, sempre trabalhando com projetos voltados para a arte e a cultura”. Herança na veia, Valentina conta de seu envolvimento em um projeto de formação de jovens artistas, a Casa do Teatro, e também sobre o projeto Plugado, de protagonismo juvenil e que chegou a receber prêmio em nível nacional.
Ela também experimentou, nas últimas eleições municipais, como é concorrer a uma vaga na Câmara de Vereadores, levando essa proposta de engajamento social em sua plataforma política. “Posso dizer que aconteceu tudo de forma orgânica na minha vida, não teve o momento em que eu disse ‘agora vou começar a me engajar social e politicamente'”, conta ela.
O envolvimento cultural não para de acontecer na vida de Valentina. Considerando-se uma jovem inquieta, ela conta que o grupo que havia sido formado lá no ensino médio foi se envolvendo com o projeto cultural Maracatu, Ponto de Cultura na cidade por um período de quatro anos. “Fizemos todo um trabalho de ensinamento das culturas afro nas escolas, e desse projeto nasceu o movimento de empoderamento feminino Baque Mulher, do qual sou coordenadora hoje, reunindo apenas mulheres da cidade para tocar maracatu”.
O Baque Mulher Foz tem o propósito de proporcionar o empoderamento feminino através da música. “Como atriz, eu me descobri na música e vi o quanto isso é poderoso e vi que precisava repassar isso para outras mulheres”, aponta ela. Valentina também começou a se envolver, a partir do Teatro Barracão, com o movimento de hip hop e rap na cidade.
O envolvimento social mais recente da estudante é com o movimento “Tá no ciclo”, ação desenvolvida dentro do projeto Baque Mulher. O "Tá no ciclo" é voltado para mulheres da cidade atingidas pelo que Valentina considera como pobreza menstrual, fazendo referência à falta de condições para a compra de absorventes íntimos e também à falta de saneamento básico na maioria das residências. O coletivo já arrecadou mais de 600 pacotes de absorventes para diversas comunidades da cidade. “Nosso trabalho também é o de levar informações para as pessoas, de pleitear essa conquista politicamente, de levar um projeto para a Câmara Municipal, para que isso se torne uma política pública e se transforme numa pauta real da cidade”, considera Valentina.
Olhar de imigrantes com foco na ajuda humanitária local
Carl Alain Bien Aime é haitiano e Laura Andrea Cristian Mosquera, colombiana. Eles não estão sozinhos na jornada de engajamento social na cidade que envolve ensino de línguas estrangeiras, ajuda humanitária e apoio ao imigrante. Eles integram um grupo de egressos – a maioria formada por estudantes estrangeiros, além de voluntários brasileiros – que atuam na ONG Integral World International Ministry (IWIM), formada em 2019.
“A UNILA fez total diferença na nossa vida, na nossa história. E a gente espera também fazer diferença na vida de outras pessoas.”
O coletivo representa bem o que é ser UNILA: são estudantes que expressam a diversidade, a multiculturalidade e o multilinguismo. Vieram para cá em busca de uma educação gratuita e de qualidade, e estão contribuindo cada vez mais com a cidade. “A UNILA fez total diferença na nossa vida, na nossa história. E a gente espera também fazer diferença na vida de outras pessoas”, diz Laura. Os membros da ONG começaram a desenvolver projetos em Foz do Iguaçu com a promoção de cursos de espanhol, francês e inglês, como atividades de extensão universitária e direcionadas a guias de turismo da cidade.
Se não fosse a pandemia, eles também estariam executando outro projeto da ONG, que é o da criação de uma biblioteca comunitária. Na verdade, a pandemia alterou todos os planos e o grupo teve que partir para outras frentes, optando por ações de ajuda humanitária mais imediata, como explica Carl, com a entrega de cestas básicas a famílias que foram duramente atingidas com os impactos sociais da pandemia. Do ano passado para cá, eles contaram com uma colaboração especial por parte da Itaipu Binacional, visto que inscreveram o projeto em um edital público e foram beneficiados com recursos para atender 150 famílias cadastradas do bairro Morumbi.
O bairro fica próximo à sede da ONG, situada no Jardim Itália. Como os integrantes da ONG trabalham e estudam, eles se reúnem aos sábados para realizar as atividades de entrega das cestas básicas. O bairro Morumbi também foi escolhido a partir de contatos que eles iniciaram com a líder comunitária, conhecida como Dona Chica. “Ela faz ações sociais no bairro há mais de 25 anos, com arrecadação de roupas, sapatos e brinquedos para as crianças. E percebemos que poderíamos aprender muito com ela também”, explica Carl.
Outra frente de atuação da ONG é o trabalho com atividades sobre imigração na cidade, especialmente em relação à situação de venezuelanos e haitianos. “Essa é uma ação importante e é muito gratificante para nós, porque este é um momento muito delicado não apenas para o Brasil, mas para o mundo todo”, diz ele. Carl já havia trabalhado com essa temática em São Paulo e percebe que, no momento, muitos venezuelanos chegam à cidade, têm experiências de vida e de trabalho e podem se inserir na realidade local. Então, esses imigrantes são encaminhados para a Defensoria Pública, Polícia Federal para regularização de documentação e também para a Casa do Imigrante em Foz, para receberem o devido apoio.
Neste momento, eles estão convidando a todos que queiram colaborar com uma campanha de doação de roupas e brinquedos novos e usados (em bom estado) para o Dia das Crianças do bairro Morumbi 3. “Deixamos o convite em aberto para a comunidade da UNILA que quiser fazer a diferença na vida de uma criança e proporcionar um Dia das Crianças mais feliz”, incentiva Laura. Para entrar em contato, acesse o perfil da ONG no Instagram.
“Trabalho social é uma pegada que me anima, não é à toa que estou nessa até hoje, gosto de ajudar as pessoas”, diz Carl, que é formado em Relações Internacionais e Integração pela UNILA. Já Laura é formada em Ciência Política e Sociologia, também pela Universidade. Atualmente, ambos são estudantes de pós-graduação na área de História e continuam em Foz do Iguaçu realizando esse trabalho inspirador.
A manauara defensora do meio ambiente na fronteira trinacional
Em qual comunidade você atua? Fátima Langbeck responde da seguinte forma: “sou universitária, estou em Foz do Iguaçu, sou católica e represento movimentos sociais da Diocese”. A egressa do curso de Relações Internacionais e Integração, que agora está cursando o mestrado em Integração Contemporânea da América Latina (ICAL), diz que suas escolhas justificam eleger a fronteira trinacional como laboratório de estudos e de vida. “Estar nesse movimento da Igreja Católica me fez ver algumas ações como comunidade”, defende ela.
Natural de Manaus (AM), ela é embaixadora do Instituto Lixo Zero em Foz do Iguaçu ou, em suas palavras, “aquela que propaga o conceito lixo zero”. Ela mantém um perfil no Instagram para divulgar ações sustentáveis que envolvem questões sobre o meio ambiente, tema que ela identifica ser uma de suas pegadas de engajamento social.
“Eu me identifico em estudar as políticas ambientais com argumentação em sustentabilidade e nas interações sociais”, diz ela, que elegeu o estudo da cooperação triangular entre os países da Tríplice Fronteira, incluindo o Lixo Zero nesse circuito. “É importante essa formação na UNILA, porque te orienta a esse modo de agir também como pessoa, como cidadã, essa paixão para construir uma identidade latino-americana”, conta.
“Como um raciocínio lógico e linear, buscar concretizar o que se ouve em sala de aula é a ação mais inteligente a ser feita.”
Fátima finalizou a graduação em Relações Internacionais com um projeto de políticas em adaptação climática na região trinacional, fazendo um recorte na gestão seletiva de resíduos sólidos na cidade. Ao fazer um levantamento para esse estudo, identificou a atuação do Conselho de Desenvolvimento Trinacional (Codetri) envolvendo as três cidades – Foz do Iguaçu, Ciudad del Este e Puerto Iguazú. “Isso me encantou, pois já existia um trabalho de cooperação, mas ainda não atuava formalmente. Então levei a questão do Codetri para o mestrado, estudando como o agente não governamental, a sociedade civil organizada, age nesse contexto. Resumindo, essa é a minha vida acadêmica”.
Ela entendeu que, na condição de cidadã e estudando o Codetri, precisava fazer parte daquele grupo. “Preciso ver como é a cooperação, fazer meu laboratório”. Foi buscando entender como funcionava tudo isso que ela entrou no Instituto Lixo Zero, já com a realidade de cooperação triangular. “Quem se envolve com voluntariado é quem já tem um conceito de vida distinto. Não quero acumular capital, tenho uma satisfação pessoal muito grande”, resume ela.
A ativista ambiental também integra o Núcleo de Sustentabilidade da Acifi – Associação Comercial e Empresarial de Foz do Iguaçu –, estimulando, dentro do sistema empresarial local, levantamentos para que esse agente se torne cada vez mais responsável pelo resíduo sólido. “Estamos desenvolvendo toda uma questão de proporcionar um selo da Acifi para incentivar essa prática ambiental. Queremos fazer um trabalho para que os empresários e associados comecem a pensar a respeito”.
Da cultura Guarani para o mundo
Em uma Universidade que preza pela diversidade, vamos fechar esse pequeno carrossel de boas iniciativas sociais falando de alguém que veio da aldeia Tekoha Anhetete, do município de Diamante D'Oeste, no Paraná. Gilmar Tupã Re Sapy Chamorro, ao ingressar na UNILA pelo primeiro processo seletivo para indígenas, em 2019, mudou-se para a aldeia Ocoy, em São Miguel do Iguaçu, e passou a dividir com todos a experiência de estar em contato com a língua e a cultura Guarani.
“Assim que entrei na Universidade, eu comecei a mexer mais com tecnologia, a usar plataformas digitais. Antes eu já estava fazendo perfis em algumas plataformas, mas não fazia tantos vídeos como faço hoje. Na Universidade, eu percebi que precisava falar um pouco mais da minha cultura Avá-Guarani e da língua. Percebo que nas plataformas digitais não existem muitos conteúdos relacionados a esses temas”, relata ele.
“É importante ocupar espaços onde as pessoas
não estão acostumadas
a ver um indígena.”
Biel Tupã, como é conhecido nas mídias sociais, diz que sentiu que precisava ser protagonista da sua própria história, não só para ensinar o Guarani, mas também para mostrar um pouco da realidade de seu povo. “Mesmo com tecnologia e possibilidades, hoje a gente se depara muito com a propagação de informações que não são totalmente reais, principalmente sobre a questão indígena. Na maioria das vezes, são informações disseminadas por não indígenas, que acabam passando algo que não é verdadeiro”, conta ele.
E foi nesse contato que aprendemos que temimbo’e é o termo usado em Guarani para a palavra estudante. E podemos aprender ainda mais ao acessar os conteúdos que Biel produz com o uso de ferramentas como TikTok, YouTube e Instagram, onde ele publica vídeos ensinando um pouco da sua língua. “A gente acredita que os preconceitos surgem em função da má informação. Ao usar as plataformas digitais, talvez a gente ajude a mudar um pouco isso, não eliminando totalmente o preconceito, mas ao menos tendo mais espaços para mostrar um pouco da nossa vida”.
Ele diz que, usando o porto-guarani (a mistura das duas línguas) com seus colegas que também vieram de tribos indígenas do interior do Paraná, o diálogo também flui com os demais. “Depois que criei os vídeos, eu percebi que muitos professores e acadêmicos tinham o interesse em aprender e conhecer mais a minha cultura Avá-Guarani. As pessoas passaram a me elogiar pela iniciativa. E o povo indígena de outras culturas também quer aprender outras línguas”, conta ele, que tem uma produção bastante ativa nas mídias sociais. Como influencer digital, Biel Tupã conta que passou a se expressar melhor. “Antes de entrar na UNILA e até nos primeiros dias, eu era uma pessoa mais tímida e ficava mais no canto. Depois que passei a fazer vídeos, isso também ajudou a me expressar mais para as outras pessoas".
E falar sobre o cotidiano, inclusive o acadêmico, fez outros indígenas de outras aldeias a se interessarem mais em estudar, a cursar uma universidade pública. No ano passado, ele lecionava a disciplina de Geografia em sua aldeia, mas este ano preferiu ter mais foco na questão do ensino da língua materna.
Antes da pandemia, ele e outros dez estudantes que vivem na mesma aldeia pegavam ônibus fretado para frequentar aulas presenciais na UNILA, numa viagem de aproximadamente uma hora e meia. “Percebo que principalmente as lideranças da comunidade indígena valorizam muito quando um de nós ingressa no ensino superior. É para o nosso crescimento pessoal, mas também para a nossa comunidade. Todo indígena que vai estudar fora nunca vai pensar de forma individual, pois quando se formar volta para ajudar a comunidade”, finaliza ele, que dá a todos a esperança de um mundo melhor.