Vida Universitária
Na UNILA há pouco mais de um ano, ucraniana pesquisa gestão pública brasileira
No final de dezembro de 2022, a ucraniana Svitlana Viktorivna Gazarian chegou a Foz do Iguaçu, deixando tudo para trás: a universidade onde trabalhava, sua casa, amigos e um país sob ataque. Agora, pouco mais de um ano depois, ela já consegue falar o português e ministra palestras de assuntos relacionados a sua área de formação: a administração pública.
Foi por meio do Programa Paranaense de Acolhida aos Cientistas Ucranianos, que a docente chegou ao Brasil, junto com seu filho, de 7 anos. Eles moravam em Kharkiv, cidade localizada junto à fronteira com a Rússia. O programa é uma iniciativa do Governo do Paraná e é executado pela Fundação Araucária, com o apoio da Secretaria estadual da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. Na UNILA, ela desenvolve projetos de pesquisa e extensão, orientados pelas docentes Katia Punhagui (Engenharias) e Maria Alejandra Nicolás do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Desenvolvimento.
Svitlana conta que não sentiu dificuldades com a implementação dos projetos e que “ficar na cidade também é bom”. “Existe a infraestrutura necessária para a vida e o trabalho, a oportunidade de visitar lugares interessantes, relaxar com meu filho”, diz, mas faz uma recomendação à Prefeitura: deixar a cidade limpa para moradores e turistas. “Na nossa cidade [Karkhiv], muita atenção é dada às questões ambientais, mesmo durante a guerra”, compara.
Doutora em Ciências da Administração Pública, Svitlana está desenvolvendo, na UNILA, uma pesquisa relacionada a questões de profissionalização da função pública sob a influência das tecnologias de informação e comunicação. “Uma tendência comum para o funcionalismo público do Brasil e da Ucrânia é o processo de renovação por meio do desenvolvimento do quadro de pessoal dos órgãos públicos e da digitalização”, aponta, completando que há uma série de questões que requerem atenção. “Em particular, estes são os temas do futuro do serviço público e o conjunto de competências exigidas aos gestores para uma atuação eficaz”, analisa e exemplifica com a exigência de “conhecimento especializado” nos editais de concursos públicos brasileiros.
A pesquisadora diz que, neste primeiro ano no país, conseguiu “analisar de forma mais completa” a experiência brasileira na administração pública. “Meus contatos pessoais com as estruturas estaduais e municipais me deram uma ideia dos mecanismos e ferramentas práticas do serviço público brasileiro.”
Os frutos da pesquisa já têm destino certo. “Usarei os novos conhecimentos e experiências adquiridos em minhas atividades profissionais, em particular, para contar aos colegas e estudantes ucranianos sobre o Brasil moderno, sobre questões que são importantes para ambos os países”, projeta.
Em relação à guerra em seu país, Svitlana diz que espera a reação dos demais países. “A guerra na Ucrânia é dor e tristeza não só para nós, ucranianos, mas para todo o mundo. A tarefa comum do mundo agora é parar a agressão russa, cancelar todas as oportunidades para a Rússia continuar a guerra. E todos que valorizam a sua vida, a vida e a liberdade do seu povo, deveriam fazer isso.” Ela citou um dos discurso de Volodymyr Zelenskyy, presidente da Ucrânia, para reforçar seu pensamento. “‘Este é o período da nossa concentração máxima. A nossa iniciativa máxima, para que seja a Ucrânia quem determine o fim justo desta guerra’. E espero que o Brasil, cada brasileiro, apoie a Ucrânia tanto quanto puder na luta contra uma invasão tão desumana.”
Acolhimento
Maria Alejandra e Katia Punhagui trabalharam de forma transversal com os projetos de extensão e pesquisa desenvolvidos por Svitlana e coordenados por elas, compartilhando atividades. O acolhimento da docente e a resolução de questões cotidianas, logo na chegada, foram responsabilidade de Katia e da aluna bolsista Vanessa da Silva Almeida.
Como projeto de extensão, ficou definida a construção de um manual sobre como proceder na chegada de novos docentes ucranianos, baseado na experiência e visão de ambas as parte,. O manual está sendo finalizado, será editado em e-book.
Maria Alejandra comenta que as diferenças culturais e linguística foram os principais desafios. “Svitlana tem um comportamento diferente dos latino-americanos. Temos uma comunicação muito fluida, próxima. Mas a Svitlana a gente aprendeu a tratar com formalidade. Ela gosta de tudo planejado, é metódica e muito profissional. Percebemos o compromisso que tem com as atividades que desenvolve”, pontua. A guerra é um fator que também tem importância no aprendizado de convivência. “Após a gente ouvir as histórias do que passou, das dificuldades, ficamos pensando ‘como é possível que tenha passado por tudo isso?’. Foi toda uma série de questões que fomos aprendendo ao longo do tempo”, lembra Maria Alejandra.
O obstáculo linguístico também é apontado pela docente Katia Punhagui. “Foi um trabalho com tempo e dedicação”, diz. Foi no “pouco a pouco” que ela e Vanessa conseguiram criar “um ambiente seguro e confiável” para que Svitlana pudesse se sentir bem na UNILA, em Foz e no país.
Como parte de seu trabalho na UNILA, a professora Svitlana está proferindo palestras, já em português, desde o final do ano passado. Na próxima quarta-feira (20), ela fala sobre a “Criação de governos eficazes: da meta global às ações inteligentes – experiências do Brasil e da Ucrânia”, a partir das 14h, na sala 003, do Campus Integração. Nessa palestra, ela irá apresentar os primeiros resultados de sua pesquisa.
A pesquisadora também desenvolveu métodos de construção de programas de pós-graduação das áreas de gestão pública, administração pública e planejamento, comenta Maria Alejandra, cujos elementos poderão ser usados pelo próprio PPGPPD na elaboração de seu processo de autoavaliação. “Tem sido muito enriquecedor. Nós nos nutrimos do conhecimento que ela tem.”
Svitlana permanece na UNILA até março de 2025. Neste período, além de palestras, também devem ser realizadas oficinas de gestão pública abertas à participação de toda a comunidade.