Você está aqui: Página Inicial > Notícias > Pesquisadora fala sobre os desafios da saúde na fronteira
conteúdo

Pesquisa

Pesquisadora fala sobre os desafios da saúde na fronteira

No episódio da série ¿Qué Pasa?, Maria Geusina da Silva faz uma análise do atendimento a estrangeiros na rede pública de Foz do Iguaçu
publicado: 28/01/2022 16h37, última modificação: 13/07/2023 16h30

As diferenças nos sistemas públicos de saúde dos países da Tríplice Fronteira trazem a Foz do Iguaçu muitos moradores das cidades vizinhas em busca de cuidados. O cenário não é novo e é um desafio constante para as administrações municipais. Como é feito o atendimento de saúde a estrangeiros? Como essa questão é tratada pela legislação? Quais os principais desafios e avanços? Para discutir o tema, o ¿Qué Pasa? conversou com a docente do curso de Serviço Social, Maria Geusina da Silva, que tem como área de pesquisa a saúde em municípios de fronteira.

“Os problemas em relação ao atendimento aos não nacionais é um problema premente e permanente”, diz Maria Geusina da Silva. Esses problemas nascem na falta de recursos destinados à rede pública de saúde de Foz do Iguaçu. “O município não tem negado o atendimento, mas tem capacidade de recursos financeiros finita e não [teria] como atender a todos, mas atende. E muito. É, sim, necessário empenho do governo federal para aumentar os recursos financeiros, principalmente, para o custeio da atenção primária e assistência especializada.”

Hoje, os serviços de atenção primária (consultas) são oferecidos a todos, brasileiros ou não, mas no caso da assistência especializada (exames, cirurgias), lembra a docente, imigrantes e mesmo brasileiros que residam no Paraguai precisam ter documentação civil – CPF, RG e Cartão do Sistema Único de Saúde (SUS). “Porque o repasse financeiro do custeio dessas ações e serviços é feito per capita. Esse cidadão precisa existir no Brasil e nele residir. É a forma que o sistema de saúde, no tocante à questão financeira, entende o custeio e financiamento das ações e serviços de saúde”, diz.

A procura da rede pública de saúde brasileira por paraguaios está relacionada às dificuldades encontradas por eles em seu país. “A Constituição paraguaia tem os mesmos princípios doutrinários que a do Brasil: a universalidade do acesso à saúde, a integralidade dos serviços (atenção primária, secundária e terciária) e a participação da comunidade na formulação e gestão do sistema de saúde”, pontua. “No entanto, não é assim que acontece”, ressalva, explicando que o sistema de saúde do Paraguai é centralizado e que os poucos serviços oferecidos de forma descentralizada são prestados, em sua maioria, por organizações não governamentais. “Com essa dificuldade de acesso à atenção primária muitos brasileiros e estrangeiros [residentes] no [Paraguai] acabam procurando o Brasil.”

Além dos atendimentos primários, os estrangeiros também têm direito aos de emergência. “A estratégia que esses não nacionais utilizam para poder acessar os serviços de saúde é deixar o seu problema se agravar. Na emergência, ele tem a certeza de que vai ser atendido e poder fazer seu exame”, comenta.

Muitos pacientes não conseguem dar continuidade aos tratamentos iniciados no primeiro atendimento, uma questão que preocupa. “São essas questões que temos problematizado e refletido”, afirma, explicando que a assistência especializada tem alto custo para o município. “Se atender, o município é que paga. O repasse é per capita e essas pessoas não contam no censo demográfico. Acaba onerando o município e é por isso que os avanços vão muito lentamente sendo constituídos porque envolvem, a priori, a questão orçamentária.”

Pandemia

No período de pandemia, houve uma intensificação no atendimento de emergência, especialmente no Hospital Municipal e na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), explica Maria Geusina. “Pessoas passavam de madrugada pelo rio e vinham em busca de atendimento e da vacina, tratamento etc. Nesse período, com o fechamento da ponte, a gente viu um acréscimo desse público por essas vias, que a gente entende como estratégia de sobrevivência já que o Paraguai demorou um pouco para receber as vacinas”, avalia.

A abertura da Ponte da Amizade com a liberação do trânsito transfronteiriço, no entanto, não sobrecarregou o sistema brasileiro. “É curioso porque o que a gente imaginou é que, com a abertura da ponte, com essa dificuldade [de acesso à saúde] e a intensificação da vacinação em Foz do Iguaçu, aumentaria a demanda. Aumentou, mas não da forma significativa como se imaginou que iria ser.”

Para a pesquisadora, Foz do Iguaçu inovou no atendimento ao imigrante com o Protocolo de Assistência a Migrantes em Situação de Vulnerabilidade, elaborado pela prefeitura em parceria com diferentes agências da Organização das Nações Unidas (ONU), como a Organização Internacional para as Migrações (OIM). O protocolo prevê assistência à saúde, social e de educação. “Foz do Iguaçu tem [esse documento] como parâmetro balizador de atendimento ao migrante.”

O protocolo vem sendo aplicado de 2018 e a principal dificuldade identificada pelos serviços de assistência é a falta de documentação, que permite o acesso aos serviços, mas também questões culturais como a falta de compreensão da língua e as diferenças na alimentação e que podem se refletir na saúde do migrante. “Os avanços vão muito lentamente sendo constituídos porque envolvem, a priori, a questão orçamentária, de recurso financeiro.”