Institucional
Governo eletrônico e ampliação da participação popular
A prestação de serviços aos cidadãos – uma das atividades mais importantes dos governos –, a dinamização dos processos democráticos e a ampliação da participação dos cidadãos nas políticas públicas são as três principais características do chamado governo eletrônico ou e-gov. A influência da internet nas discussões democráticas da América Latina e a implementação de soluções digitais pelos governos são o tema de reflexão da pesquisadora María Alejandra Nicolás, docente do curso de Administração Pública e Políticas Públicas, neste episódio da série ¿Qué Pasa?, disponível no canal da UNILA no YouTube.
“O governo eletrônico diz respeito à capacidade que os governos têm de comunicar-se com seus diferentes públicos, tanto internos quanto externos, com a sociedade civil – organizada ou não – e com o setor privado”, comenta a docente. “A ideia da incorporação da internet é que possa trazer benefícios aos governos. Obter seja mais eficácia, seja mais eficiência na entrega do serviço, mais qualidade”.
O Uruguai, lembra a docente, é um dos países na América Latina com a melhor oferta de serviços de governo eletrônico, sendo citado entre os sete mais avançados do mundo no setor. “É um país relativamente pequeno, mas que vem implementando políticas de investimentos maciços para o desenvolvimento do governo eletrônico.” O Brasil também é destaque nessa área, assim como Argentina, Chile e México.
Entre os principais obstáculos para o avanço dos governos eletrônicos, cita a professora, estão questões de infraestrutura, da falta de um corpo técnico especializado e também de normativas. “Temos que recordar que qualquer política pública está ancorada na legitimidade pública e isso se manifesta, em certa medida, através de normativas.”
A docente cita como exemplo de serviços disponíveis por meio do governo os relacionados aos tributos, como o que facilita a declaração do Imposto de Renda, e aplicativos que facilitam o agendamento de serviços de saúde e seguridade social. Muitos serviços foram acrescentados nas plataformas digitais em consequência da pandemia, o que reduziu a presença física de pessoas nos ambientes fechados. “Os governos tiveram de adaptar-se de uma forma bastante drástica em consequência das medidas adotadas para evitar o contágio. Houve um avanço na maioria dos países da América Latina, inclusive no Brasil, no número de serviços”, salienta María Alejandra.
Uma das consequências da oferta de serviços e informações no âmbito do governo eletrônico é a contribuição para a transparência pública e a participação dos cidadãos. “Necessitamos de informação para poder formar uma opinião sobre os governos”, diz, lembrando que, no Brasil, a própria Constituição prevê a participação cidadã. A professora cita como exemplo os orçamentos participativos digitais e o Marco Civil da Internet, de 2009, que, “apesar de uma participação mais reduzida, possibilitou a incorporação de 40% das propostas feitas pela sociedade na proposta final”. O feedback foi um aspecto importante desse projeto. “Não se repetem muito essas experiências. Essa [falta de feedback] pode desmotivar a participação dos cidadãos”, ressalta.
Políticas públicas
Mais que acesso digital, é o acesso a diferentes informações que garantem aos cidadãos o monitoramento de políticas públicas. Por isso, os dados disponibilizados digitalmente pelos governos ganham importância. “As políticas públicas passam por um percurso de vida, têm uma trajetória e buscam um objetivo. O monitoramento diz respeito, justamente, a acompanhar e avaliar essa política ao longo do tempo. E a internet vem contribuindo, de fato, para esse processo, tanto para a participação dos cidadãos, quanto para o acesso à informação pública”. Ela cita o exemplo das Leis de Acesso à Informação, que vêm sendo implementadas nos diferentes países da América Latina desde a década de 2000.
Atrelada à transparência pública e ao desenvolvimento das agendas digitais está a disponibilização de dados abertos à sociedade. Para serem consideradas dados abertos, as informações devem ser disponibilizadas em formatos específicos. “Nem todo dado disponibilizado é considerado aberto, porque tem de estar dentro de um formato de software livre. O cidadão, o pesquisador não precisa instalar um programa pago para ter acesso ao serviço”, reforça María Alejandra. Outra característica é que esses dados também têm de ser oportunos e precisam ser reutilizados.
Os avanços na transparência pública esbarram no desenvolvimento da infraestrutura de tecnologia de informação e comunicação e no acesso por parte da população. “Um dos grandes obstáculos é que falta um acesso à internet com qualidade. Esse serviço é muito caro na América Latina. Esse é um obstáculo que os governos precisam resolver. Precisamos que mais pessoas tenham acesso à internet.”